Monday, January 23, 2006

À sua espera

Eles já se conheciam há quase um mês. Teresa, sempre muito bem arrumada, nunca esquecendo-se de combinar cores de roupas, sentia algo diferente nele, algo que a trincava, que a incomodava, todavia nomear aquilo não conseguia. Roberto sempre fizera o tipo conquistador, era popular entre as meninas e o sucesso nunca havia sido efêmero. O que acontecia era que nenhuma delas sabia que eram apenas uma dentre tantas. Interessava-se por um bom corpo, simpatia, timidez. As tímidas o excitavam, ele gostava do prazer retraído. Conheceu Teresa através de José, um amigo da faculdade de Direito. Tudo começou naquele dia naquele bar. José levou Teresa e mais um amigo para comemorar a passagem para o quinto período da faculdade. Teresa, no terceiro de Enfermagem, conseguiu manter uma boa conversa paralela com Roberto. Todos conversavam harmoniosamente e, às três da manhã, trocaram todos os telefones. Uma semana depois, Roberto surpreende Teresa ao telefone:

-Teresa? Lembra de mim? Roberto, José, Direito, bar, semana passada?
-Olá Roberto, como iria esquecer-me de você? Como está?
-Estou bem. Preciso de um favor seu.
-Ah, sim, diga.
-Diga-me, o que devo fazer com alguém com crise de pressão alta?
-Pressão alta? O que houve? É sua mãe?
-Sim, ela.

Pretexto. Como ele pôde?!

-Muito obrigado, Teresa, eu sabia que poderia contar contigo.
-Por nada, Roberto, quando quiser, tem meu telefone.
-Obrigado mesmo. O que fará amanhã à noite?

E então, encontrar-se-iam no dia seguinte, mesmo bar, ter uma boa conversa. Ele era atencioso, ouvia a todas aquelas palavras desorganizadas em função da timidez. Ela olhava nos olhos dele com pouca freqüência. Deixou-a em casa e tentou um beijo, mas ela se fez de difícil e não correspondeu. Arrependeu-se quatro segundos depois, mas já era tarde demais.

-Eu entendo, Teresa, deve ser cedo demais.
-Não, é que... não sei... não sei o que houve e...
-Tudo bem. A gente se vê.

Ela ligou para ele uns dias depois e quis encontrá-lo para conversar. O encontro seria na praça principal do bairro às sete. Já eram quase cinco da tarde, o sol já se despedia e o nervosismo chegava à Teresa. Sua mãe perguntou-lhe as horas: "falta uma hora e trinta para as 7, mãe" e logo deu-se conta do que havia dito. Tratou de corrigir-se: "são cinco e meia". Ela não conseguia pensar em nada mais. Aquela noite seria decisiva. Teresa iria descobrir sua ousadia pela primeira vez na vida. Ela queria saber que existia de verdade.

Eu tenho lugar. Eu sou Teresa. Eu sei o que possuo e é tempo de descobrir-me. É tempo de doar-me. Eu tenho vontades e existo. Eu existo porque sei o que quero e sei o que sou. Preciso desembrulhar-me desse papel de alumínio para que ele veja quem sou. Ele não sabe do que eu sou capaz. Ele não me conhece e nesse ínterim ele não pôde me saber. Ele não me viu. Não porque não quis, mas porque não lhe mostrei.

Sinto nele algo que me fisga. Sinto que o olhar dele fixo a mim me envolve como a voz revolve a fala. Como águas quentes num dia de inverno me completam. Como o toque envolveria o corpo. Como se aquele olhar penetrasse por mim e ultrapassasse o alcance de minha visão. Não me importa o fato de tê-lo conhecido há pouco. Eu sei o que sinto. E já era hora de saber. Eu não sei o que ele sente, nem sei se ele desconfia do que eu sinto. Mas se desconfiasse, não desistiria de mim. Se não esperasse algo, não me encontraria hoje à noite. Ou quer ele apenas conversar? Não. Eu lembro daquele olhar. Dou adeus à ingenuidade e abro as asas porque sou livre. Eu sou minha.

Teresa tomou seu banho em meio a tantos pensamentos e saiu de lá limpa e livre para a vida, pela primeira vez. Arrumou o vestido preto e os sapatos que havia ganho de sua prima Inês. Era seu aniversário de dezoito e os sapatos ainda cabiam. Era imensa a felicidade por poder ter escolhas. Ela gostava de ter opções. O mundo material para ela nunca foi de tanta importância, mas sua auto-estima veio de sua descoberta, e passou a agarrar-se à moda e à aparência.

Às seis e meia, sairia de casa. Até a praça, são vinte minutos a pé. Ela estava decidida. Ela sabia o que fazer, embora não soubesse que sabia. Seus pensamentos a afogavam e então Teresa fingiu parar de pensar. Afogou-se em seu perfume, então. E nessa troca, deu continuidade à arrumação: arrumou o cabelo, passou uma leve maquiagem e chega. O que ele iria pensar se se arrumasse tanto? Que Teresa pretendia exibir-se?

Tirou o vestido e pôs uma saia leve e uma blusa branca de seda. Mais confortável, ela estava linda. Os sapatos pequenos de Inês ficaram perfeitos com aquelas roupas. E a seda? Proposital. Quando Roberto a tocasse, tocaria aquele tecido leve debaixo do qual encontraria a pele de Teresa, tão macia quanto sua blusa. Todo o corpo macio, esperando pelo toque e pelo beijo de Roberto.

Seis e vinte e cinco. Ela foi à praça. Chegou lá e sentou em um dos bancos à espera de Roberto. A praça estava cheia. Já eram cinco para as sete e nada de Roberto aparecer. Sim, ele é pontual. Roberto não vai chegar antes da hora combinada. Deve pensar que sou como a maioria das mulheres que acham que chegar atrasada é um charme. Deixar a pessoa esperando. Não sei. Sete e dez, onde está Roberto?

Teresa olha para o relógio já aflita, mas quer aceitar que ele chegará. Já faltam vinte minutos para as oito. Ela olha ao redor impaciente. Vê casais de namorados em bancos, vê crianças no parque, vê pessoas passando. Os namorados e suas carícias em público são as imagens que mais a atraem e ao mesmo tempo a repulsam. Ela perde suas esperanças. Não todas.

Eu sei que ele vem. Ele não pode fazer isso comigo, eu sei que existo para mim. E para todos. Se ele não vier, o que essas pessoas irão pensar? O que eu irei pensar? Onde ficará Teresa? Eu já me afirmei, ele precisava me confirmar. Por que atribuo isso a ele? Porque é a primeira vez que deixo isso acontecer.

Roberto não virá. Desistiu de mim e nem ao menos se preocupou em me avisar. Não sei mais se sou. Não sei mais se sinto, se procuro, se desespero, se me preocupo. Eu me procurei e me achei. Por culpa de Roberto. Ele é culpado. Porque o que fez não entendo. Por que fez isso comigo? Pelo simples facto de eu não ter correspondido aquele beijo? E agora o que faço com esse desejo e com esse arrependimento? O que faço? Ele deveria estar aqui para ao menos me responder.

Teresa decide voltar para casa e ligar para Roberto. Pega o telefone, seca as lágrimas que não caíram e disca aquele número, o qual pretendia nunca mais olhar. Embora em sua memória ele já estivesse gravado. Pensava que o emocional era controlável e por inúmeras vezes foi posta à prova. Ela mesma!

Roberto atendeu o telefone. Disse-lhe que decidiu não ir porque assim seria melhor. E por que a deixara esperando feito uma tonta? Por quê? Ele é um completo idiota. Ela não queria mais saber. Roberto não havia atingido o que Teresa esperava. Ela estava confusa. Quem era Teresa? O que fazer com Teresa? Teresa tem mais experiência.

Teresa sou eu e eu sou o que penso. Meus pensamentos sobre mim mesma refletem no que sou. Eu precisei de exteriores para descobrir-me e isso nunca deverá acontecer novamente. Eu aprendo coisas sozinha, por ações que não realizo sozinha. E eu sei ser. Porque eu aprendi a ser.

Roberto nunca mais apareceu. Nem Teresa. Apenas para ela mesma, e para quem a conquistasse de verdade. As roupas de seda não estariam mais aptas a um primeiro ou segundo ou terceiro encontro. Ela havia amadurecido, finalmente, embora se lembrasse claramente do que queria ter vivido e não viveu.

2 Comments:

Anonymous Anonymous said...

Thaaaaa! Td bem c vc? Pelo visto vc consegue escrever + do q eu...rs
Muito maneirinho esse texto! Vê se lê o meu post, tadinhu....colabora lá c os humildes...rs..dá uma força! hehe Bjs!

10:07 PM  
Anonymous Anonymous said...

Mto bom!!! Vc escreve super bem sabia???
E não mude o jeito de escrever hein!!!
Beijoss

6:50 AM  

Post a Comment

<< Home